Diogo Mateus - Será que devíamos explorar e comercializar o espaço?
- dmateus2004
- 18 de fev. de 2021
- 9 min de leitura
Atualizado: 26 de abr. de 2021
1. Introdução
Em meados do séc. XX, no meio da Guerra Fria, as duas grandes potências mundiais participavam numa batalha de influência de ideais políticos, onde quem conseguisse provar que era o mais desenvolvido saía vitorioso. Nessa altura, ambos os países viraram parte da sua curiosidade e pesquisa para o espaço. Quem o conseguiria conquistar primeiro? Assim, em 1957, num dia de outono, foi lançado o primeiro satélite artificial na órbita da Terra, Sputnik, iniciando assim uma nova era, a espacial.
Foi notável, desde essa altura, a rápida evolução da tecnologia espacial. No espaço de 15 anos, a Humanidade conseguiu colocar 12 pessoas sobre a superfície da lua, criámos milhares de sistemas comunicações por via de satélites, enviámos sondas para explorar as superfícies de vários astros e muito mais. Parece que a nossa rápida evolução tecnológica não dá sinais de abrandar, não sendo difícil imaginar um futuro no qual empresas espaciais consigam sustentar-se apenas da venda de recursos espaciais. Coloca-se assim em causa se será moralmente correto comercializar o espaço? Como deverão ser divididos esses recursos? Por quem deverão ser divididos? Sendo o espaço considerado “de ninguém”, será justo alguém o considerar seu apenas por chegar primeiro?
Acabei por escolher este tema através da visualização de uma entrevista feita ao famoso multimilionário Elon Musk. Foi-lhe colocada a seguinte questão: “You know there are American heroes who don’t like this idea. Neil Armstrong and Gene Cernan have both testified against commercial space flight in the way that you are developing it and I wonder what do you think of that?” Eu nunca me tinha questionado sobre os dilemas que este tópico pode gerar e esta pergunta fez-me pensar sobre os mesmos.
Assim, tenho como objetivo dar a conhecer os problemas que podem emergir deste tópico e como os potencialmente solucionar, dando assim a conhecer os mesmos ao leitor. Para além disso, pretendo também mostrar que deveríamos explorar e comercializar o espaço, apresentando motivos e justificações para a realização do mesmo.
Quadro de Referência Teórico
O que nos leva a explorar e comercializar o espaço?
Antes de nos questionarmos se devíamos explorar e comercializar o espaço é importante percebermos o que nos leva a fazê-lo. Assim, reuni três razões que podem ajudar a responder a esta questão:
A sede humana por curiosidade e a ânsia pela evolução
O Homem é um ser que teme o desconhecido. É por este mesmo motivo que, segundo certos autores, quase ninguém se suicida, apenas por curiosidade. Não sabendo o que há do outro lado porque eu arriscaria tudo o que conheço? Mas se nós desconhecemos totalmente o espaço, então porque procuramos explorá-lo? O Ser Humano teme o desconhecido, mas sente-se também atraído pelas pontas soltas de um puzzle maior. Um exemplo deste conflito pode ser ilustrado através da análise às imagens (A e B) apresentadas de seguida.
A B


Enquanto sentimos uma enorme curiosidade por conhecer a totalidade da imagem A, sentimos um desprezo ou até mesmo receio em relação à imagem B, visto que não temos qualquer ideia do que pode estar escondido atrás do pano completamente negro. O mesmo pode ser dito do Espaço. Durante séculos observámos o Cosmos a partir da Terra, mas nunca o conseguimos conhecer totalmente e possivelmente nunca o conseguiremos. Esta mesma ideia é o que propulsiona a nossa sede de evolução e curiosidade.
Recolha de recursos
Outro motivo que nos poderia levar a explorar e a comercializar o espaço é a nossa necessidade de recursos. O Ser Humano tem vindo a gastar cada vez mais recursos e estes são finitos, pelo que ou estabilizamos o seu consumo ou então teremos de os explorar noutro local, o Espaço. Para além disso, muitos recursos podem vir a ser bastante úteis para a nossa civilização. Um exemplo disso são asteroides ricos em água. Esta mesma água pode vir a ser dissolvida em hidrogénio e oxigénio, os principais componentes para o combustível de foguetes, o que pode vir a ser uma maneira de reabastecer foguetões durante uma viagem espacial. Esta mesma água pode resolver vários problemas em relação à sede mundial, caso encontrássemos uma forma viável e mais barata de a recolher no futuro. Para além disso, outros planetas e asteroides podem conter recursos e minerais que não existem em tanta abundância na Terra, como o lítio, utilizado na fabricação de imensos aparelhos eletrónicos. A construção de infraestruturas destinadas para a pesquisa científica poderiam também ser um dos principais motivos para a exploração e comercialização espacial.
A nossa sobrevivência como espécie
Não é difícil imaginar que, num futuro distante, o planeta Terra deixe de ser um local habitável. Isto é algo expectável porque o Ser Humano dá normalmente prioridade à resolução de problemas mais atuais face a outros mais distantes, por maiores que sejam. Um exemplo disto são as alterações climáticas. A exploração espacial poderá servir como um plano de reserva para quando tivermos de mudar de planeta, por exemplo, para Marte.
Seria justo explorar e destruir outros planetas como os conhecemos?
Mas uma questão se sobrepõe: Será justo explorar e destruir outros planetas tal como hoje os conhecemos? Agora que sabemos o porquê de sentirmos necessidade de explorar o Espaço, podemos começar a colocar as perguntas que conflituam diretamente com o problema principal. Algo que vai colidir diretamente com este mesmo problema é a colonização de planetas. Temos nós o direito de os destruir? Estaremos nós a destruí-los ou melhorá-los?
No processo de colonização estaremos a destruir o planeta. Isto pode ser difícil de perceber: como pode ser considerado destruição a colonização de um planeta tão desolado e inabitável? Assim como consideramos destruição a alteração de estruturas naturais, incluindo mares, rios, montanhas, minérios ou fósseis, o mesmo pode ser dito para qualquer objeto ou estrutura presente noutros planetas. Se os tentamos preservar na Terra também os devíamos preservar fora dela.
Defesa – Destruição Justificada
Embora a exploração de Marte possa ser considerada destruição, a mesma pode ser também justificável como criação, pelo menos do ponto de vista humano. Assim como escavámos certas zonas para desvendar o passado dos nossos ancestrais e destruímos edifícios antigos para criar novos, o mesmo pode ser dito sobre a exploração espacial. Nem todos os locais de Marte possuem valor ou interesse científico, histórico, estético ou outro. É possível colonizarmos esses planetas tentando preservar os locais mais importantes do mesmo, tal e qual como o fazemos na Terra. Para além disso, estaríamos a desperdiçar o valor de muitos recursos, estruturas e objetos desses planetas que só conseguiríamos obter criando infraestruturas no mesmo.
Deveríamos arriscar recursos humanos?
Uma vida humana é algo precioso que não pode ser facilmente recuperado uma vez que desaparece. Seria assim justo arriscar a vida de talvez dezenas de pessoas apenas pela colonização de um planeta? Seria justo privar estas pessoas de uma vida na Terra? Já que estas pessoas teriam uma qualidade de vida bastante menor em comparação às pessoas que habitam a Terra.
Para respondermos a estas questões, considero necessário analisarmos um de muitos eventos históricos que ilustram a ideia que pretendo passar. Um exemplo de um destes eventos é o 25 de abril. Nesta altura, a população portuguesa estava sujeita a um regime fascista, que limitava a liberdade da população e consequentemente diminuía a qualidade de vida dos habitantes. Foi assim necessário um sacrifício de algumas pessoas para lutar pelo futuro. Muitas pessoas puseram a sua vida na linha por esta melhoria de qualidade de vida e felizmente, tudo correu bem naquele dia. Outro exemplo deste sacrifício é o facto de os estudantes abdicarem de parte da sua felicidade no presente para adquirir uma felicidade futura, que muitas das vezes se demonstra na forma de uma boa nota.
O mesmo pode ser dito para a exploração e comercialização espacial. Sem o sacrifício de alguns como poderemos assegurar a maior felicidade dos futuros. A mudança é algo que a maioria dos Seres Humanos tem medo, mas sem mudança não é possível existir evolução e sem ela nunca poderemos melhorar as coisas que possuímos de forma a criar um mundo melhor.
“Toda reforma interior e toda mudança para melhor dependem exclusivamente da aplicação do nosso próprio esforço.”
Immanuel Kant
Como última argumento a esta resposta, é importante referir que as pessoas que se sacrificam por nós, neste caso os astronautas, são pessoas treinadas para a tarefa e que não foram de todo obrigadas a realizar estes sacrifícios. É um trabalho que eles próprios escolheram e amam realizar.
Sendo o espaço de ninguém, como o poderíamos comercializar sem criar conflitos territoriais? Será isso possível?
Porém, sendo o espaço de ninguém, como o poderemos comercializar sem criar conflitos territoriais? Será isso possível? Até agora conseguimos encontrar razões para explorar o Espaço e justificarmos as alterações que consequentemente poderemos causar. Precisamos agora de provar se esta ideia é prática o suficiente de modo a não trazer mais problemas do que vantagens. Assim, irei tentar provar que é possível, a título de exemplo, colonizar Marte, evitando conflitos territoriais sérios entre os Humanos.
Esta não é a primeira vez que o Ser Humano se deparou com este tipo de problema de partilha territorial. Os oceanos revelaram o mesmo tipo de problema. Existia um vasto espaço do qual ninguém era dono, havendo assim bastantes conflitos territoriais nessas águas. Numa tentativa de resolver este problema, as duas potências marítimas da altura, Portugal e Espanha, criaram o tratado de Tordesilhas, que dividia este território em duas partes. Apesar de este tratado ter resolvido os problemas pendentes na altura, com o aparecimento de novas potências marítimas, este parou de surtir qualquer efeito, criando assim mais conflitos.
Podemos assim concluir que dividir o território de Marte pelas empresas espaciais existentes não é uma boa solução para este problema, visto que apenas seria uma solução para os próximos tempos, já que é provável que sejam posteriormente criadas mais empresas com os mesmos objetivos.
É também importante perceber que não é viável atribuir uma área de exploração restrita a cada empresa, deixando espaço para novas possíveis empresas, como exemplificado na figura seguinte.

Figura 1: Possível distribuição de territórios
Esta ideia não seria viável porque assim que as empresas gastassem todos os recursos no seu território, quereriam utilizar os restantes recursos ainda disponíveis nos territórios desocupados, até à sua extinção. Assim, acredito que uma solução seria a criação de uma Lei Espacial que implementasse a seguinte regra:
O território restrito de cada empresa seria determinado pelo interior de um círculo com um determinado raio, igual para todas as empresas, centrado na estrutura humana desenvolvida por essa empresa.

Figura 2: Distribuição mais adequada de territórios
Esta regra obrigaria as empresas a desenvolverem novas infraestruturas humanas para obterem território adicional, criando assim a necessidade de fornecer algo útil para a Humanidade (um custo na perspetiva da empresa) para obter áreas territoriais adicionais. Como é bastante difícil e caro construir infraestruturas num local tão desolado e inóspito como Marte, o processo de preenchimento do mapa territorial marciano não seria fácil e rápido, dando assim, por um lado, oportunidade para novas empresas aparecerem e preencherem os territórios inocupados e, por outro lado, premiar aquelas que contribuem para o desenvolvimento humano.
Considerações finais:
Com tudo isto, podemos considerar como terminado o processo de investigação e argumentação anteriormente realizado visto que possuímos, no meu ponto de vista, as mais importantes questões respondidas. Penso que deixei claro que deveríamos explorar e comercializar o cosmos, uma vez que possuímos um motivo e uma justificação para o fazer, para além disso são também apresentadas algumas respostas a alguns possíveis problemas que poderíamos encontrar no decorrer desta aventura, tanto problemas éticos, como práticos.
Considero assim, que os objetivos propostos no início do trabalho foram realizados com bastante sucesso. Penso ter desenvolvido com sucesso os problemas que proponha apresentar no início deste ensaio. Para além disso, foi possível perceber os vários motivos por de trás deste tópico e as respostas a diferentes problemas ao longo do caminho, que vêm a sustentar a ideia da exploração espacial. Penso que podemos concluir assim que a exploração e comercialização espacial tem muito poucas desvantagens sendo, na minha opinião, bastante claramente algo que deveríamos realizar nos próximos anos.
Apesar de tudo isto considero que existem algumas limitações neste trabalho. Uma delas é o facto de não ter conhecimentos suficientes para abordar a parte económica que esta questão põe em causa. Apesar de não ser o foco do ensaio, considero algo importante que sou incapaz de desenvolver por completo. A segunda limitação foi o facto de este trabalho não ter sido realizado de uma forma puramente focada no assunto, já que o mesmo foi desenvolvido entre variadíssimos outros trabalhos escolares que limitaram o meu aprofundamento da matéria. Em contraditória, acredito que deixei de forma bem clara e explicita os meus argumentos e opiniões sobre a temática e acredito que este projeto pode vir a esclarecer o leitor dos motivos que estão por de trás das nossas ações para além de criar e mostrar como devemos ter um espírito crítico no que toca a este género de problemas. Acredito assim que o meu trabalho é original e aborda um tema que não se encontra tão presente nas discussões da atualidade.
Ao longo deste ensaio, considero ter aprendido bastante já que, tive a possibilidade de consolidar algumas ideias e opiniões que possuía sobre o assunto em mão, para além de ter tido a oportunidade de criar novas ideias. Fico assim bastante satisfeito com o trabalho que realizei porque acredito que está bem realizado e desenvolvido.
“Não é no espaço que devo procurar minha dignidade humana, mas na organização do meu pensamento. Não me fará bem possuir terras. Pelo espaço o Universo me agarra e me engole como uma partícula; pelo pensamento sou eu que o agarro.”
Blaise Pascal
Feedback qualitativo:
Introdução: ***(+)
QRT: ****(+)
Considerações finais: *****
Diogo Mateus, n.º 8
11.º CT3
Diogo: Texto muito bem escrito, com uma "musicalidade" que não é muito comum em pessoas da sua faixa etária e que revela clareza de pensamento e interesse e conhecimento acerca do tema; Não obstante isto, a abordagem filosófica do tema é pouco explorada. Poderia ter desenvolvido a argumentação e contra-argumentação e clarificar alguns conceitos que ficam em "suspenso" e sem a abordagem suficiente. [Carlos Gaspar]
Socorrendo-se de uma linguagem descomplicada e infatigável para o leitor, este ensaio toca uma matéria que, apesar de profundamente interessante para a sociedade atual, se apresenta vedada à compreensão de muitas pessoas, por pressupor um grau de abstração que estas julgam não conseguir atingir – e é exatamente na tentativa (bem conseguida) de esclarecer o tema principal que reside a característica mais apreciável do trabalho. A apresentação de uma proposta que visa solucionar, de antemão, conflitos originados pela divisão territorial do Espaço demonstrou muita criatividade e, a juntar a isto, a introdução de esquemas ilustrativos a acompanhá-la contribuiu para que o seu conteúdo pudesse ser facilmente apreendido. No entanto, a pormenorização dos moldes em que a “Lei Espacial” funcionaria e…
O texto está escrito de forma bastante clara, encontra-se bem fundamentado e revela um produtivo trabalho de pesquisa e investigação. As ilustrações afiguram-se como um auxílio significativo na compreensão das ideias expostas no ensaio.
Contudo, tenho de discordar do meu colega aquando da sua afirmação de que a imagem B suscita desprezo, não creio que assim seja. A imagem B suscita, acima de tudo, curiosidade.
Considero que seria pertinente explorar mais afincadamente as questões éticas relativas à problemática, incidindo em questões colocadas na introdução e que acabaram por não ser respondidas. Como por exemplo no que toca à identidade dos responsáveis pela atribuição das zonas espaciais e se deveria, ou não, ser aplicada a regra de pertença a quem "chegar…